Embasados na teoria estética de Hegel, Adorno e Horkheimer escreveram durante a segunda Guerra Mundial este que é considerado o principal livro sobre teatro e história da cultura escrito na Alemanha no século XX. Dialética do esclarecimento trata, numa primeira leitura, da questão da iluminação - das luzes e das sombras - no teatro ocidental, desde o teatro na Grécia Antiga, dos rapsodos da Odisséia às tragédias da era clássica, até o teatro do entre-guerras - abrangendo, portanto, nomes seminais como Antoine, Stanislavski, Artaud, Pirandelo e Brecht -, sem deixar de passar, é claro, pelo teatro dos séculos XVI, XVII e XVIII - Shakespeare, commedia dell'arte, Lope Vega, etc.
Os autores mostram como o caminho da iluminação no teatro não foi uma simples história de evolução, mas um processo dialético, que alternou períodos de busca de luz, com outros de busca de sombras: se na Grécia Clássica as tragédias eram obrigadas a serem organizadas conforme as estações do ano, o horário que o sol se punha, e outros entraves da natureza, no século XX o domínio da luz e da sombra era completa, com a sala de teatro e a iluminação artificial por spots - algo antecipado por Caravaggio, ainda no fim do século XVI, início do XVII, com sua técnica do chiaroscuro).
Uma leitura mais atenta, contudo, mostra que por trás da história da iluminação no teatro, Adorno e Horkheimer acabam por construir uma breve história da cultura ocidental, a partir do domínio de novas tecnologias pelo homem e da alteração na forma de percepção da realidade - fruto dessas mesmas tecnologias -, que acabavam por influenciar as formas de representação do real - que se utilizavam dessas mesmas tecnologias, num retorno ampliado do real.
Como conclusão da obra, os autores lançam uma nota sombria sobre o futuro, caso não se concretize a necessária mudança (radical) nas formas de produção social, de modo que haja alterações nas formas de representação do real, e a possibilidade do retorno à liberdade artística dos grandes mestres do teatro. Eles escrevem isso ainda sob o choque com as experiências das guerras, do realismo socialista e, principalmente, do neo-classicismo da Alemanha nazista: eles viam as sementes destes dois últimos movimentos no teatro de massa que surgia, os musicais da Broadway, assim como no cinema estadunidense.
Curiosidades: Escrito em alemão, o livro foi lançado em 1944, em Nova Iorque, Estados Unidos, pela editora dos próprios autores.
Dialética do esclarecimento entra no candente debate na Escola de Frankfurt, e é uma clara resposta da corrente liderada por Adorno e Horkheimer (cujo pai era o principal financiador do grupo) a muitos dos textos de Walter Benjamin, contra-corrente solitária dentro do Instituto para Investigação Social de Frankfut. Benjamin era defensor do teatro épico de Brecht e Dialética do Esclarecimento traz um veemente ataque ao dramaturgo bávaro. Ainda antes do lançamento do livro, Benjamin tomou conhecimento de partes dele, e redigiu uma segunda versão de seu "A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica", de modo a tentar não ser expulso do Instituto.
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